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quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

“ O cotovelo é o joelho do braço”[1] -

Interfaces[2] iconográficas para Crianças
in marketeer nov.2007



Comecemos por uma adivinha? Qual é o ícone (símbolo) do e-mail?
Um envelope. Porquê? Obviamente porque simboliza correio e o símbolo mais simples para associar a correio é um envelope. Nós, os adultos, ainda somos do tempo em que se escreviam cartas. Ainda recebemos as contas dentro de um envelope. Mas será que as crianças fazem a mesma associação? Nos dias de hoje, fará sentido essa metáfora?

O computador há muito que se fixou como uma ferramenta de trabalho obrigatória. No entanto ultimamente tem vindo assumir uma enorme importância como ferramenta de comunicação e lazer. E, esta realidade é válida quer para adultos, quer para crianças. Mas será que a linguagem gráfica utilizada está de acordo com a estrutura cognitiva das crianças? Será que os ícones utilizados e desenhados pelos programadores são os adequados?

Embora o Design de Interfaces seja um conceito amplamente discutido e suportado por estudos e literatura publicada, estes dirigem-se essencialmente aos adultos. Só recentemente começaram a surgir estudos dirigidos ao design dos produtos informáticos para crianças (bem como nas outras áreas do design gráfico).

Da análise feita em crianças que estão a começar a aprender a ler, descobrimos que simultaneamente as interfaces convencionais são problemáticas e que são necessárias interfaces iconográficas. Temos assim um problema para resolver: as metáforas e arquétipos que são usados para os adultos podem não ser satisfatórios para as crianças.
Assim é necessário recorrer a uma nova linguagem iconográfica e às respectivas metáforas, de forma a desenvolver um modelo mental ou uma compreensão conceptual.

A investigação levada a cabo por D. A Norman [3] indica que os modelos mentais dos utilizadores (neste caso dos computadores) desempenham um papel fundamental ajudando-os a usar os sistemas inteligente e eficazmente.

Para que seja “fácil-de-usar” e “fácil-de-aprender”, a interface deve ser consistente com este modelo mental, recorrendo a metáforas gráficas, ideias para o desenho singular de ícones, sugestões para o reconhecimento do simbolismo icónico, e uma estrutura no qual os utilizadores possam identificar os significados funcionais dos ícones.

A redução do erro; a orientação por objectos; a manipulação directa (etc.); são algumas das vantagens das interfaces iconográficas (Gittens, D[4]) não deixando, contudo de serem problemáticas.

As desvantagens surgem, principalmente, na dificuldade de implementação, e não de qualquer propriedade inerente aos ícones. É difícil de projectar ícones, para comunicar um significado desejado, sem invocar outras conotações. Um ícone pode ainda valer mil palavras, e nem sempre são mil palavras que o designer tem em mente.
A interpretação de um utilizador e a intenção do designer podem ser bastante diferentes.

O caso complica-se ainda mais quando comunicamos com crianças.
Embora a linguagem icónica ajude a criança, que aprende e recorda, também pode ter consequências disfuncionais. A criança pode deduzir aspectos, não intencionais, do ícone que a levam à confusão e ao erro.

Os ícones devem representar metáforas próximas do modelo mental das crianças. Temos que desenvolver ícones que, de facto, se parecem com objectos familiares, com os quais as crianças se podem relacionar.

A relação entre os ícones e os referentes deve ser clara e directa, com funções idênticas às funções executadas em objectos físicos (da vida real) e formas semelhantes a esses objectos. O facto de os ícones serem justamente aproximados ao modelo conceptual, reduz as hipóteses de possíveis interpretações e confusões, e torna as funções de mais fácil compreensão.
Escolhendo os ícones certos, podemos sugestionar metáforas apropriadas e desencorajar outras.

Temos, no entanto, de ter muito cuidado com as analogias e metáforas escolhidas quando tratamos com crianças uma vez que os nossos modelos mentais estão, frequentemente distanciados dos delas.
Este desacerto pode causar às crianças uma grande dificuldade em conseguir reconhecer os ícones correctamente.
(Uma criança de 4 anos, identificou o ícone de deficiente num parque de estacionamento, como sendo um ícone de casa de banho, provocando-lhe estranheza e confusão).







As crianças tomam decisões sobre o que gostam ou detestam, e sobre o que querem, ou não, fazer. Se os nossos modelos conceptuais não emparelharem com os modelos mentais delas, é difícil forçá-las a aceitar os nossos modelos.

Idealmente os ícones deviam ser desenhados por crianças, mas não sendo isso possível (tendo em conta as limitações inerentes), deverão intervir na sua criação dizendo como é que elas achavam que os desenhos deveriam ser. Esta exigência é difícil de cumprir porque, à parte de não sermos nenhuns mind-readers, ninguém é “artista” suficiente capaz de visualizar e traduzir (visualmente) os pedidos delas.

Porque as crianças estão a crescer num ambiente de multimédia, com tecnologias modernas como os videojogos, televisão, filmes, etc., elas esperam que a interface seja interactiva e animada. Preferem ícones animados a ícones estáticos, porque dão vida aos símbolos, que representam aplicações completas ou funções dentro de uma aplicação. Concluímos, então, que se quisermos desenvolver uma interface eficiente que apoie as crianças, temos de prestar atenção ao que elas têm a dizer e ao que querem fazer. Temos que entender os modelos mentais delas.
Sem esta compreensão, é muito duvidoso que possamos desenvolver uma linguagem icónica que as ajude. Entendendo isto podemos aprender muito sobre a sua predisposição para jogar, entusiasmo e o tipos de metáforas a incluir na interface.

Um exemplo feliz, desta interacção directa da criança no desenvolvimento gráfico de uma interface, foi a conclusão a que os criadores de um software infantil chegaram.
A utilização do tradicional ícone (a seta invertida) para fazer UNDO - CTRL+Z - é normalmente problemática, por um ser conceito demasiado abstracto, as crianças têm dificuldade em entendê-lo. Estes criativos, usaram como metáfora, a onomatopeia oops!, facilitando assim a utilização por parte das crianças.

Não nos podemos esquecer que as crianças desta faixa etária não sabem ler (ou então estão a começar a fazê-lo), como tal, não lhes é possível trabalhar sozinhas, sem ajuda de um educador (ou um narrador electrónico que explique as instruções).
Assim a solução mais correcta é a de incluir a presença de uma, ou mais personagens que acompanham e ajudam a criança através do programa. Sendo conhecida a dificuldade em se manterem atentas por muito tempo, é recomendável que esta ajuda seja dada à medida das tarefas que a criança tem a cumprir.

As crianças preferem uma interface icónica porque a acham mais fácil de usar. Todas as crianças gostam de animações. Preferem os ícones animados porque acham que estes podem demonstrar a função, que respondem à pergunta "o que posso fazer eu com isto? ". Consideram-nos estimulantes, interessantes, e muito úteis.
Veja por exemplo a alegria e diversão que as crianças expressam quando vêm outra janela a aparecer (pop-up).

O grafismo deve ser divertido mas não demasiado infantil, para a criança não se ressentir. Quanto mais concreta for, melhor, tendo em conta a criança ter dificuldade em entender conceitos abstractos.

Às crianças falta a experiência de fontes primárias e secundárias necessárias à interpretação dos ícones. Contudo, nestes casos, as crianças podem reflectir questões culturais mais abrangentes que não são detectados por muitos outros estudos.
Hoje já muitas crianças que não identificam o ícone de enfermeira (com o chapéuzinho), pois nem elas, nem os pais foram contemporâneos deste uniforme.
Obviamente, como qualquer alfabetização, as crianças podem aprender o código, serem ensinadas em relação ao significado de cada ícone, mas, neste contexto, o que se pretende é que as crianças identifiquem por si, o seu significado.

O problema é que os gabinetes de comunicação visual, em Portugal, são generalistas prestando os seus serviços para todas as áreas de negócio e, a maior parte das vezes não conseguem aprofundar e especificar os conhecimentos que este target exige.
A diversidade e complexidade das necessidades nas diferentes faixas etárias, torna assim indispensável a existência de técnicos formados e especializados na comunicação visual com as crianças.

Mariana de Almeida Mattos - mariana@xsdesign.pt
Designer de Comunicação Visual
Doutoranda em Design Gráfico para Crianças.
Fundadora da XSDESiGN - design de comunicação visual especializado em crianças.
www.xsdesign.pt


[1] Isabel 6 anos
[2] * [substantivo feminino; modalidade gráfica de apresentação dos dados e das funções de um programa; (De inter-+face, pelo ing. interface)]
[3] . [(1986). Cognitive Engineering. In D.A. Norman & S.W. Draper (eds.) User Centred System Design. Hillsdale, NJ. Lawrence Erlbaum Associates.]
[4] [(1986). Icon-based human-computer interaction. International Journal of Man-Machine Studies 24. pp 519-543]

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